5/20/2010

A herança horrenda

Mais um soneto de Augusto dos Anjos:

"Apóstrofe à Carne

Quando eu pego nas carnes do meu rosto,
Pressinto o fim da orgânica batalha:
- Olhos que o húmus necrófago estraçalha,
Diafragmas, decompondo-se, ao sol-posto...

E o Homem - negro e heteróclito composto,
Onde a alva flama psíquica trabalha.
Desagrega-se e deixa na mortalha
O tato, a vista, o ouvido, o olfato e o gosto!

Carne, feixe de mônadas bastardas.
Conquanto em flâmeo fogo efêmero ardas,
A dardejar relampejantes brilhos,

Dói-me ver, muito embora a alma te acenda,
Em tua podridão a herança horrenda,
Que eu tenho de deixar para os meus filhos!"

1 comment:

Kacius said...

Bá, não lembrava deste. E olha que tenho o livro com obra completa. Muito 10, mas o mais pesado é aquele que fez pro filho natimorto. brrrr