"Carolina escondeu-se dentro do armário de seu quarto, como fazia sempre que seu pai enlouquecia por causa da bebida. Era uma verdadeira tortura, ter que agüentar os gritos, as brigas, os xingamentos. Nesta noite, o casamento de seus pais terminou.
Carolina foi puxada para fora contra a sua vontade. Olhou para os olhos de seu pai e encontrou os olhos de um estranho. Dominado por uma raiva cega e estúpida, ele começou a bater e a bater naquela pessoa que tanto o prezava, apesar de todas as coisas ruins que ele fazia.
Carolina sabia, enquanto o sangue brotava por todo o seu corpo, que aquela era a gota d´água, nada mais seria o mesmo. Mais tarde, no hospital, um policial tomou o seu depoimento, o depoimento de uma garota com olhos roxos, costelas fraturadas, cortes por todo o corpo. Uma garota ferida por seu próprio pai, uma garota que teve a sua alma partida em dois pedaços.
Carolina nunca mais reencontrou o pai. Ele passou alguns anos na prisão, pagando pelas sucessivas agressões fisicas e mentais praticadas contra a esposa e a filha. Depois de voltar ao convívio da sociedade, ele não teve coragem de encarar a sua família novamente. Ele veio a falecer, vítima de um tiro durante um assalto, no mesmo ano em que Carolina formou-se em Jornalismo.
Carolina buscou, em seu íntimo, compreender porque passara por tudo aquilo na infância, mas jamais encontrou uma resposta plausível. Seu pai era muito ciumento, e muito inseguro em relação à várias coisas, como a sua vaidade e a sua verdadeira importância no mundo. Para ele, ser um pai de família nunca fora o bastante.
Carolina escondeu-se durante toda a sua infância, escondeu-se na sala de aula, escondeu-se nas aulas de balé, escondeu-se nos almoços e nos jantares. Depois daquela fatídica noite, ela sentiu-se livre após viver enjaulada por uma eternidade. Mas essa liberdade custou caro, muito caro. Custou à Carolina a sua inocência, a sua crença na capacidade de amar, uma parte de sua perfumada humanidade."
Continua...
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