"Carolina preparava-se para dormir quando o blecaute aconteceu. Era uma noite de terça, uma típica noite do inverno gaúcho. E, de uma hora para outra, as estrelas voltaram a reinar absolutas.
Carolina pegou a lanterna no criado mudo, foi até o banheiro e voltou para se deitar. Agradecia agora à gripe que a tirou da comemoração pelos 30 anos do jornal A Nova Fronteira e a deixou em casa, no conforto sagrado de seu lar.
Carolina escondeu-se sob as cobertas e tentou pegar no sono durante vários minutos sem alcançar sucesso. Resignada, levantou-se, foi até a cozinha e fazer um lanche e depois voltou para a cama, munida de um caderno e uma caneta.
Carolina, sob a pálida luz de sua lanterna, começou a esboçar sua crônica de final de semana, que falaria sobre o caos em que se encontra a saúde pública brasileira. O tempo passou, a crônica concluiu-se e ela finalmente conseguiu dormir. Mas não por muito tempo.
Carolina foi acordada por um grito às duas da manhã, um grito animal, primitivo, apavorante. Ao abrir os olhos, Carolina viu parada na frente da cama uma menina, vestida com um longo vestido branco.
Carolina, sem entender coisa alguma, logo reconheceu a menina. A menina era ela mesma na flor de seus treze anos. A menina sorriu, e começou a dançar de forma frenética pelo quarto. Não havia música alguma.
Carolina assistia aquele bizarro show, pensando estar louca ou alucinando por algum motivo qualquer. A menina então parou, olhou para sua versão adulta e começou a mexer os lábios. Ela falava, mas não se ouvia qualquer som. Quando acabou seu discurso, ela chorou, e então esvaiu-se em sangue, sangue que logo também acabou por desaparecer.
Carolina foi trabalhar na manhã seguinte, ansiosa por reencontrar seus colegas, ansiosa por qualquer contato humano que a fizesse esquecer novamente aquela parte de si que ela julgava perdida, enterrada para sempre nos sombrios abismos da memória, mas que acabou por reaparecer no estranho acontecimento da noite anterior."
Continua...
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